Desde que tenho compreensão das coisas percebo que a expressão que identifica a nossa região tem conotação de miséria e violência. Quando se fala em Baixada Fluminense em qualquer lugar desse país e até mesmo fora daqui a primeira ideia que se tem é de uma realidade pré-civilizacional.
É evidente que a Baixada não é só isso. Há encantos, há desenvolvimento, há muitas coisas boas, mas a maior parte do nosso cenário é miserável. Chamo atenção para esta condição: miserável. Não estou falando de pobreza, mas de miséria.
A miséria é como se depois de descer toda a escadaria social, abríssemos ainda um porão e entrassemos nele. É a barbárie, a indecência, o terror. Fome, insalubridade, doenças, tristeza, desesperança, violência, indignidade e ignorância que não humilham apenas aqueles que sofrem com tudo isso. Humilha-nos a todos, porque há fartura suficiente a se distribuir, há recursos humanos e financeiros para resolver, mas faltam-nos elementos com credibilidade política e social para fazer a união de todas as pontas que podem formar uma grande rede de promoção social capaz de tirar os miseráveis dessa condição.
REDE DE PROMOÇÃO SOCIAL
Não podemos dizer que nada é feito pelos miseráveis. Seria injusto e mentiroso. Há muitas pessoas e instituições que fazem muitas coisas. Há a Igreja, congregações religiosas de todas as matrizes, organizações do terceiro setor e, sobretudo, o poder público.
Recentemente recebi de nosso bispo diocesano Dom Gilson Andrade um vídeo em que era contada a iniciativa do Papa Francisco de doar uma quantia para a Diocese de Nova Iguaçu, valor convertido em cestas básicas. Percebam que a fama de miséria da nossa Baixada é conhecida em Roma. No vídeo, o bispo nos conta a forma como aquele gesto do Santo Padre inflamou a Igreja na diocese e influenciou empresários e outras pessoas a também fazerem suas partes por amor ao próximo.
O problema é que a Igreja faz muito, mas sua ação tem limites. Da mesma forma outras entidades religiosas também o fazem. O Estado, por sua vez, atua sem critérios e de forma desordenada. Metaforicamente falando, é como se os particulares capinassem e limpassem o lote, mas ao invés do governo cimentar e construir ali, ou ele não fizesse nada ou construísse em terreno sujo. E onde a Igreja limpou pouco tempo depois o mato volta a crescer.
Não bastam ações isoladas. Precisamos de uma ação coordenada, com compromissos e metas. Uma união da sociedade fluminense e iguaçuana e de seus múltiplos atores. É preciso que uma ou mais lideranças comecem a unir essas muitas forças para dar um primeiro passo. Sem carreirismo político, sem pensar em seus objetivos particulares, apenas motivados pelo amor que Deus infunde em nós.
E de todos os elementos dessa possível rede de promoção social quem é o mais forte é o poder público. Os líderes do Estado e dos municípios precisam ter a grandeza de pensar no povo miserável, abandonar a assistência social estéril, que mata a fome de hoje sem perspectiva para os problemas que continuarão. E iniciem assim uma trajetória virtuosa de promoção social dos miseráveis.
Nossa realidade é tão grave e escandalosa que empobrecer as pessoas significa ascensão social. Tirar pessoas da miséria e permitir que sejam em um primeiro momento pelo menos pobres, sem luxos e confortos, mas com o básico, é uma evolução que precisamos promover nos bairros, comunidades e favelas mais carentes dessa região que vai deixar de ser sinônimo de violência e miséria. Depende apenas de nossa organização, vontade e amor a Deus e ao próximo.