A onda crescente de abusos dos ministros do Supremo Tribunal Federal durante os últimos anos não é algo que tenha surgido do nada. Trata-se de uma aplicação de certa ideologia jurídica à ação estatal. Em outros tempos, o establishment recorria à força para controlar o Executivo e, dessa forma, mandar no Estado e na sociedade. Atualmente, do neoconstitucionalismo à juristocracia, é o manejo de ferramentas ideológicas e da propaganda que garantem a legitimidade dos abusos de poder.
Há mais de 250 anos, os Estados têm se conformado à proposição de Montesquieu a respeito da divisão do poder estatal em três: Executivo, Legislativo e Judiciário. O teórico francês Benjamim Constant ainda desenvolveu a tese do Poder Moderador, que deveria garantir a harmonia dos outros três, sobrepondo-se a eles. Uma experiência do Poder Moderador foi justamente no Brasil, nos primeiros 77 anos do Brasil independente. Mas, isso é outra história.
A IDEOLOGIA DO NEOCONSTITUCIONALISMO
O fato é que nas últimas décadas fortaleceu-se a ideia golpista do neoconstitucionalismo. Essa ideologia jurídica prega que os juízes devem extrapolar suas atribuições e reformar a sociedade usando interpretações convenientes às suas ideias dos princípios constitucionais. É como uma ditadura, mas sem os inconvenientes do recurso à força e sem a resistência social. Tudo revestido pelo verniz da boa intenção e de uma falsa legitimidade.
Dessa forma, em resposta a ações propostas por partidos políticos (via de regra, partidos nanicos e de esquerda), a Suprema Corte modifica a legislação e a própria Constituição. E o faz à revelia da soberania popular, que é exercida indiretamente pelos congressistas, eleitos pelo povo.
JURISTOCRACIA: A DITADURA DA TOGA
As semelhanças com uma ditadura não são poucas. As decisões são dadas por pessoas não-eleitas, como ocorre com ditadores. São impostas, como nas ditaduras. E, o pior: não há a quem recorrer, pois os outros poderes nada podem fazer.
E no Brasil, podemos estar indo do neoconstitucionalismo à juristocracia, a ditadura do Judiciário. Sob a aparência de normalidade, já chegamos ao ponto de vermos um inquérito conduzido pelo STF em que um ministro atua como investigador, acusador e julgador, levando o processo criminal a uma realidade anterior às modernas garantias processuais.
JUIZ NÃO É LEGISLADOR
E, recentemente, vimos mais uma página dessa ideologia botando as manguinhas de fora. A ex-ministra Rosa Weber, na última página da sua triste passagem pelo STF, votou favoravelmente à descriminalização do homicídio de bebês no ventre materno. A partir da leitura de seu tanatofílico voto favorável ao aborto, um desavisado creria estar diante de um discurso parlamentar. Discurso mórbido e de mau gosto, sim. Mas em nada parecido com um voto fundamentado no Direito. Em nada semelhante ao exercício da jurisdição.
STF É FUNDAMENTAL EM SEU PAPEL VERDADEIRO
Não é este o papel constitucional do Supremo e não é a instituição STF que é o problema. O tribunal é essencial, mas seus atuais componentes, abraçando esta ideologia e seus procedimentos, desvirtuam seu papel. E invadem a competência dos outros poderes.
CIDADÃO COMUM PRECISA SABER
É compreensível que o cidadão comum não perceba que pode estar caminhando aos poucos a uma nova espécie de ditadura. A ideia dos ditadores do século XXI é precisamente essa: agir como tais, mas sob a representação simbólica de agentes democráticos. Não à toa, a palavra democracia não sai de suas bocas. Parecer democrata será fundamental a eles. E é por isso que escrevemos para alertar a sociedade para o que está acontecendo. Quem tiver olhos para ver, que enxergue.