Passado o calor dos acontecimentos, trago algumas notas sobre o caso Daniel Silveira, analisado objetivamente, sem paixões ou juízos de valor. Se você ainda está muito chateado, não leia, porque a nossa pretensão é a leitura do cenário de forma fria.
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Confesso que o que mais me surpreendeu nessa história foi a reação dos bolsonaristas. Decepção, tristeza, desapontamento, indignação são os sentimentos que grassaram desde a prisão do deputado Daniel.
Mas, eu me pergunto: vocês esperam o que dos inimigos? Lealdade? Justiça? Já não está claro o suficiente para nós a ameaça que o movimento conservador significa para o establishment?
Eles usam e usarão sempre todas as armas. Eles estão lutando pela sobrevivência.
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É evidente que pelos critérios de justiça e legalidade a prisão do deputado Daniel Silveira é absurda e qualquer um de nós aqui votaria contra.
Como, aliás, os deputados mais alinhados ao bolsonarismo – que são cerca de 120 – votaram. O total de 130 votos contra a prisão contou ainda com os votos da bancada do partido Novo, que divergiu do seu líder João Amoedo e votou pela legalidade.
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Dito isto, ou seja, considerando a realidade como ela é, a decisão da Câmara surpreende menos.
O que é realmente digno de registro foi o volume da votação. 364 votos não deixa qualquer margem de dúvida para a já tão comentada antipatia que o deputado Daniel inspira em seus pares.
Justa ou injusta essa antipatia – não estou fazendo juízo, apenas descrevendo o que vejo -, o que surpreende é que os deputados disseram claramente com seus votos o seguinte: este deputado não vale um desgaste com o Supremo.
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Outra reação que devemos registrar é a revolta dos bolsonaristas com os aliados do Centrão. E aí está uma oportunidade de se compreender a diferença entre aliados eventuais e aliados permanentes.
Política é uma arte. A aliança eventual em torno de agendas comuns não significa adesão dos aliados a todas as nossas lutas. O Centrão é um aliado eventual em pautas e projetos. Podemos nos aliar a eles também em eleições aqui ou ali para derrotar a Esquerda e evitar um mal maior.
Mas é imaturidade achar que as divergências desaparecem ao se fazer alianças eventuais. Ora, essas uniões são para trabalhar pelas convergências, mas as divergências continuam existindo.
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O que se comentou muito em Brasília é que se fosse outro deputado ou deputada, a Câmara provavelmente relaxaria a prisão. Em um tribunal político (como o parlamento às vezes é chamado a se comportar), a justiça e a lei não são as bússolas preferidas dos julgadores.
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Parece-me claro que a cassação de Daniel Silveira é fato consumado e só demorará o prazo regimental para ser concluída.
A indignação do deputado no vídeo gravado era justa e verdadeira. Foi por isso que ele recebeu tanto apoio na sociedade contra a arbitrariedade que está sofrendo. Porém, seu pedido de desculpas e a admissão de que errou devem, provavelmente, sepultar a sua liderança política.
Se sustentasse seu posicionamento, o deputado Daniel Silveira poderia continuar sendo uma liderança influente, mesmo cassado. Poderia apoiar aliados, influenciar nas eleições seguintes ao seu processo de cassação. Mas sua capitulação e pedido de desculpas enfraqueceram bastante essa identidade dele com o eleitor indignado.
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Enfim, o justo e o injusto contam pouco no Parlamento e a verdade é que os efeitos da repercussão do vídeo e da prisão arbitrária do deputado Daniel nos prejudicarão em alguns pontos.
A empreitada de emplacar Bia Kicis na Presidência da CCJ já não estava fácil e agora é caso perdido.
A lua de mel entre Governo e Congresso que vinha desde as eleições de Rodrigo Pacheco e Arthur Lira, esfriou um pouco.
A paz institucional que o Presidente Bolsonaro tem tentado construir para poder governar também sofreu um novo abalo.
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É o que sempre digo e vou repetir, parafraseando o Professor Olavo de Carvalho: é urgente ter paciência. Vamos errar, vamos acertar. Vamos dar alguns passos adiante e outros para trás. Tudo é muito novo para o conservadorismo no Brasil. Há alguns anos nossa alternativa era o Aécio Neves ou o José Serra. Hoje temos um presidente conservador no Planalto.
Isso não basta para mudar muita coisa. Ainda mais em tão curto período. O conjunto dos inimigos do país – o establishment – é muito mais poderoso, organizado e experiente que nós.
Sejamos conservadores, afastemos de nossos corações as ideias revolucionárias. Prudência, maturidade, calma e inteligência. Não vamos nos desesperar, tampouco nos dispersar.