Grande parte dos eleitores do movimento conservador brasileiro fisgou a isca. O projeto vem sendo muito bem conduzido. Pablo Marçal é um habilidoso comunicador, especialista em programação neurolinguística (PNL) e capaz de vestir o figurino necessário para vender seu produto.
Um nome que até recentemente a maioria dos seus mais inflamados entusiastas ainda não tinha ouvido falar ou sabia muito pouco a respeito. O que Marçal fez para ser identificado com um bom nome por eleitores conservadores ninguém sabe. É tema para os estudiosos das ciências sociais. Mas, o fato é que ele caiu como uma luva para o gosto do eleitorado de Jair Bolsonaro.
Contudo, apesar de ser o principal assunto das últimas semanas, o x da questão da eleição paulistana não é Pablo Marçal. Também não é Guilherme Boulos. Muito menos Nunes, Tabata ou Datena. Tudo o que temos assistido tem uma razão de ser: o Coronel Mello Araujo, policial militar da ROTA e candidato a vice prefeito na chapa de reeleição do prefeito Ricardo Nunes.
QUEM É MELLO ARAÚJO
O Coronel Mello Araújo ficou conhecido nacionalmente durante o Governo Bolsonaro. Na ocasião, foi nomeado o comandante do CEAGESP, um dos maiores centros de abastecimento do mundo, que atende à região metropolitana do Estado de São Paulo. Linha dura, Mello Araujo moralizou o funcionamento da central de abastecimento, notadamente a exploração dos trabalhadores mais humildes que eram achacados para poder trabalhar.
Mas por que um mero candidato a vice prefeito é o x da questão? “Vice não manda nada”, dirão alguns. Explico.
O X DA QUESTÃO
Há questões políticas que podem ser ditas e outras que não podem ser ditas em momentos eleitorais. Uma das mais inconvenientes é de que um candidato a prefeito deixará o cargo logo no início de seu segundo e último mandato para garantir uma vaga de deputado, senador ou governador. É o caso de Ricardo Nunes. Ele não permanecerá os quatro anos na Prefeitura. Renunciará em abril de 2026 para concorrer a algum cargo, preferencialmente o de senador, ou outro, se assim lhe indicar as pesquisas na ocasião.
Isso não é algo que se fale, mas é evidente que o apoio de Bolsonaro está condicionado a colocar um bolsonarista na cadeira de prefeito em 2026.
Para o PL, esse seria o caminho mais curto e mais provável para chegar na cadeira de prefeito e evitar uma vitória de Boulos. Afinal, uniriam-se a máquina do Município e a força do bolsonarismo contra o petismo e seus sócios. Mas o sistema não cochila, sobretudo diante da aterrorizante perspectiva de ter um coronel da ROTA controlando o terceiro maior orçamento da República a partir de abril de 2026.
A FALSA NARRATIVA
Marçal conseguiu viralizar a narrativa de que Bolsonaro é refém de Valdemar Costa Neto nesta questão da prefeitura de São Paulo. Uma balela. A decisão de apoiar Nunes foi de Bolsonaro também. O x da questão foi a condição: termos um prefeito bolsonarista a partir de abril de 2026.
MARÇAL, O NOVO TRUNFO DO SISTEMA
Não podemos afirmar se Marçal é um plano do sistema. Mas é, no mínimo, um belo golpe de sorte dos inimigos do interesse público. Afinal, o establishment já tentou de tudo para tirar Bolsonaro do jogo. Não conseguiu nem mesmo com a inegibilidade. Onde Bolsonaro vai é ovacionado. Pesquisas indicam que ele vence Lula se disputar a eleição de 2026. O que fazer diante de um sujeito cuja popularidade se mostra absolutamente resiliente? Emular um novo Bolsonaro.
E é isso que é Pablo Marçal: a emulação de um novo Bolsonaro. Só que um suposto novo Bolsonaro com rédeas curtas, disposto a dialogar até com Alexandre de Moraes.
Pela primeira vez um plano para destruir Bolsonaro parece viável. Muitos bolsonaristas incautos não pensaram duas vezes diante dos encantos retóricos do habilidoso coach: eis o novo líder da Direita do Brasil. Aquele que até recentemente dizia que Lula e Bolsonaro só se diferenciavam pelo número de dedos da mão, agora vende-se como um Bolsonaro ainda melhor que o original.
O sistema percebeu que poderia matar dois coelhos com uma cajadada só. Em um primeiro momento, a mídia dá grande publicidade aos momentos de habilidade retórica de Marçal nos debates para que ele possa tirar Nunes do segundo turno, evitando assim que em 2026 tenhamos um prefeito bolsonarista na capital paulista. Em um segundo momento, sangrará o bolsonarismo, dividindo-o, promovendo uma discórdia entre os conservadores do Brasil sem sequer ser um conservador, prejudicando a resistência a Lula em 2026.
É PRECISO QUE SE DIGA O QUE NÃO PODE SER DITO
Alguém precisava falar o que nem Bolsonaro, nem Ricardo Nunes, nem seus assessores jamais dirão: o Coronel Mello Araújo é o x da questão. Tirar Nunes do segundo turno é o papel que Marçal está ali para desempenhar a favor do sistema que, no segundo turno dará uma rasteira qualquer nele para garantir a vitória de Boulos. De quebra, ganharão mais um aliado contra Bolsonaro na organização da luta contra o petismo em 2026. O establishment não brinca em serviço e nem cai na lábia de salvador da pátria: ele vai lá e faz o que for necessário para ganhar.