A aplicação prática da doutrina social da Igreja não é tarefa das mais simples. E os desafios para essa empreitada ainda não foram enfrentados por muitos. Embora conheça a matéria há cerca de 25 anos, poucas vezes encontrei comentadores do pensamento social católico que fossem além da exposição histórica ou do proselitismo político-ideológico.
A dificuldade para o fiel católico ou para qualquer indivíduo de boa vontade é saber como se orientar nas situações reais de sua vida cotidiana à luz da tradição iniciada pelo Papa Leão XIII e ampliada por seus sucessores.
A APLICAÇÃO PRÁTICA DA DOUTRINA SOCIAL DA IGREJA NA VIDA DAS EMPRESAS
A rigor, para que um empresário aplique a doutrina social da igreja na gestão de seus negócios, ele depende de algumas condições.
A primeira é que ele precisa ser um católico devoto, com vida de oração e reflexão sobre a fé católica e conhecimento da mensagem do Evangelho. Em segundo lugar, é necessário que as pessoas que trabalham com ele estejam dispostas a comungar desse espírito de comunhão em Jesus Cristo a serviço do Bem Comum.
Esses são os primeiros aspectos a considerar. Não basta que o empresário seja batizado ou que se autodeclare católico. É necessário ter, pelo menos, uma noção da mensagem do Evangelho de Jesus Cristo e a disposição de, por meio da oração e da vida prática, perseverar na fé e dar testemunho dela.
Comunicar a seus colaboradores que a empresa deverá se orientar por esse espírito é um segundo passo. Não é fácil lidar com pessoas. Mais difícil ainda é agir com bondade em uma estrutura econômica que deve ser eficiente sem que todos que participam dessa engrenagem sejam colaborativos e, reciprocamente bons entre si.
O terceiro desafio, do qual conheço apenas esboços teóricos muito primários, é a necessidade de uma metodologia de aplicação do pensamento social católico às circunstâncias reais e práticas do dia a dia das empresas. Os documentos pontifícios são obras que orientam com prescrições universais cujos alvos são desde governantes até o mais simples indivíduo. Urge, pois, que os católicos se engajem nessa tarefa de subsumir a especificidade da vida econômica das empresas na mensagem de Jesus Cristo.
PASTORAIS DO EMPREENDEDOR
Com o florescimento das chamadas pastorais do empreendedor, cada vez mais comuns, seguramente da experiência surgirão reflexões sobre esses desafios. Mas não poderemos ficar apenas no empirismo.
Nossa proposta aqui é apontar o que nos parecem ser os primeiros nós a desatar nesse novelo para a reflexão intelectual e metodológica.
OS DESAFIOS E SEUS ATORES
Quanto ao primeiro ponto, o da vida de oração e compreensão da mensagem evangélica, caberá aos senhores sacerdotes zelar por esse amadurecimento do seu rebanho reunido nas pastorais dos empreendedores. Sob pena de, não o fazendo, vermos as ditas pastorais se comportando de maneira bem diferente daquela que espera Nosso Senhor de nós.
Quanto ao segundo ponto, este diz respeito sobretudo ao empresário, que deverá comunicar seus propósitos aos seus colaboradores. Além disso, deverá avaliar se há um permanente espírito de comunidade em cada um deles.
O terceiro desafio está aberto a todos os católicos, mas demandam conhecimento mais profundo da doutrina católica em geral, da doutrina social da Igreja em específico e da realidade da vida empresarial. E se é difícil encontrar quem reúna tantos predicados, parece-nos claro que este deve ser um trabalho conjunto, que deverá ser liderado e organizado por poucos em uma síntese que facilite a aplicação prática.
É TUDO AINDA MUITO NOVO
Em uma caminhada de dois mil anos, os 133 anos da doutrina social da Igreja são como alguns segundos. É tudo muito novo e há que se considerar que esta doutrina não apareceu pronta em 1891. Ela vem sendo construída ao longo das décadas em que os papas têm trocado os pneus do carro com ele andando. Ao mesmo tempo que se consolidam pontos da doutrina, novos desafios socioeconômicos aparecem. Mas na caminhada é preciso não parar de dar os passos. Que estejamos dando um passo consistente na Igreja do Brasil com as pastorais do empreendedor. E, dessa forma, contribuir para a aplicação prática da doutrina social da Igreja nas empresas.