Já falamos algumas vezes sobre o fenômeno do surgimento de uma direita conservadora no Brasil a partir de 2013. E que esse movimento está ainda na sua infância. É preciso não perder isso de vista. O processo de amadurecimento dessa nova força política que se consolida depende, dentre outras coisas, de ter projetos de gestão pública. Dentre eles, um projeto de gestão municipal de Direita.
Observando atentamente a ação política da Direita, percebe-se que as iniciativas dos ativistas e políticos conservadores têm sido até agora, via de regra, de natureza reativa. São as justas e necessárias rejeições às iniciativas absurdas da Esquerda que têm constituído nosso inventário de ação política.
É natural que tenha sido assim até aqui. A internet deu voz à maioria conservadora, que gritou: – Pode parar. Meus valores não são esses. Não aceito esse caminho.
O surgimento dessa nova Direita foi um despertar de valores e princípios. É efeito da filosofia de Olavo de Carvalho e da evangelização promovida por bons católicos e protestantes nas últimas décadas.
Porém, se estamos orientados pela boa teoria, é necessária a ação. A fé sem obras é morta, já nos orientou o Apóstolo S. Tiago em sua Carta. E esse princípio serve não apenas à vida espiritual, mas também para a política.
Ir além do reação ao que não presta é um dever, não apenas para encerrar esse ciclo em que estamos, pautados pelos adversários. Mas, sobretudo, para ordenar a política aplicada aos valores e princípios corretos.
EXEMPLO DE AÇÃO POLÍTICA PROPOSITIVA
Vamos dar um exemplo. Nós, conservadores, fazemos a defesa incondicional da vida humana. É um princípio nosso, correto? Mas como nós defendemos esse princípio a forma aplicada aos desafios que a realidade social se apresenta? Há muitas formas, como a defesa do direito de possuir armas de fogo ou a luta contra as tentativas de descriminação do homicídio no ventre das mães, eufemisticamente chamado de aborto.
Vamos citar o exemplo desse que é o pior de todos os crimes: o aborto. Da maneira que hoje atuamos, vivemos em um eterno enxugar de gelo que, uma hora ou outra, derreterá por completo. Por um lado, os adversários relativizam a vida humana e buscam viabilizar que esse homicídio não seja punível. Por outro, a Direita, apenas reagindo, como sempre, e lutando contra a transformação deste homicídio em direito.
Mas isso não basta. Quais seriam, então, as políticas públicas que a Direita teria a propor para o problema do aborto? Quais as políticas públicas propomos paras as mulheres (e seus parceiros) que são pegas de surpresa com uma gravidez inesperada?
O que a sociedade quer para o futuro dessas crianças que lutamos para não serem mortas despedaçadas no ventre materno com o apoio da própria mãe? Quais as políticas públicas de pré-natal e para a primeira infância que nós desejamos acrescentar às já existentes?
Percebam que abordando apenas o tema da defesa da vida humana, um de nossos princípios mais caros, já surgem demandas sem fim. E elas aguardam respostas que, se não oferecermos, os adversários da vida vão fazê-lo em nome da morte.
ELEIÇÕES MUNICIPAIS
Quando falamos de gestão pública municipal a coisa fica muito mais complicada. É de duvidar, com toda a franqueza, que exista algum político capaz de produzir um programa de gestão municipal de Direita no Brasil. Muito menos, que algum esteja preparado para aplicar esse programa, na medida do possível, dentro da conjuntura da nossa legislação, das práticas políticas vigentes etc.
Há muitos políticos que se dizem conservadores e que até se sentem conservadores. Mas não há nenhum capaz de transformar teoria em ação. E isso não é demerito. Como não canso de dizer, estamos na infância do conservadorismo brasileiro.
Chamo esse perfil de político de “DINO: Direitista no Nome”. Os DINOs estão à solta e perdidos. Ninguém tem culpa de estar nessa condição. Se o comunismo tem mais de 100 anos de prática, o conservadorismo brasileiro tem dez anos de caminhada, apenas.
SAIR DA INTENÇÃO À PRÁTICA É QUESTÃO DE SOBREVIVÊNCIA, MAS É MUITO DIFÍCIL
Essa dificuldade das lideranças tem como consequência uma dificuldade para o eleitor: como identificar quem é realmente conservador de Direita? Há aqueles poucos que têm o apoio direto de Jair Bolsonaro, o que lhes confere uma chancela.
Outros, porém, lutam para estar no Partido Liberal, de Bolsonaro, porque isso lhes garante uma identificação simbólica. Contudo, o eleitor já desconfia disso. Afinal, existem inúmeros casos de oportunistas que se beneficiam do voto conservador, todavia, depois de eleitos, traem seus eleitores.
O modelo que funcionou em 2018 e, em certa medida, em 2022, provavelmente se esgotou. Nas eleições municipais de 2020, ele não deu resultado. O eleitor quer o político conservador legítimo, que reúna discurso, resposta para os problemas concretos à luz do discurso, mas apresentando ação e resultado. E isso só conseguiremos quando deixarmos de atuar apenas para evitar que o PT e toda Esquerda piore o que já não está bom.
Se é apenas pelo caminho da Direita que vamos fazer o Brasil avançar, temos que apresentar essa rota. É um mapa que ninguém tem. E ninguém até hoje fala em elaborar. Espero estar rompendo esse silêncio, que se permanecer será fatal.
COMO SAIR DA TEORIA PARA A PRÁTICA
Se o político conservador não buscar a construção de políticas públicas genuínas, ele irá gradualmente ser tragado para a social-democracia. É inevitável, porque todo o sistema caminha para o socialismo e a sobrevivência de quem não tem uma orientação própria, dependerá de se adaptar às existentes.
Aos direitistas só restará o anticomunismo combinado com momentos de reação e momentos de adesão às ideias socialistas. E sem nem perceber. Repito: é inevitável. Também será inevitável o eleitor se cansar da farsa e do farsante e procurar outro pra votar.
Lamentavelmente, não temos as universidades e não temos espaço dentro do próprio partido com o qual mais nos identificamos no momento, o PL, para desenvolver esse debate e para construir um projeto para o Brasil, para os estados e para os municípios, de inspiração realmente conservadora. O PL tem o Instituto Alvaro Valle, que deveria servir a essa finalidade, porém, por motivos que não cabe aqui debater, acaba não exercendo sua missão.
Sairão na frente os líderes da Direita que encontrarem quem tenha experiência intelectual e política para orientá-los na construção desse caminho conservador. Sobretudo para uma gestão municipal de Direita. E aqui vão dois conselhos. 1° conselho: É preciso que, necessariamente, capacidade intelectual robusta e experiência efetiva na política real estejam combinadas na mesma pessoa; 2° conselho: corram, pois não devem haver muitos disponíveis por aí.
Em breve falaremos mais sobre este assunto por aqui.