A análise política precisa ir além da mera observação distanciada dos acontecimentos. Para compreender os atos de um agente político convém colocar-se em seu lugar e considerar cada passo que o fez chegar até ali. E, ainda, ter em mente que compreender algo não significa concordar.
A indicação de Kassio Nunes Marques para a vaga de Celso de Mello no STF surpreendeu a todos e embaralhou nossas cabeças. Até ontem de tarde eu mesmo apostava que o nome de Kassio era um boi de piranha para emplacar um nome mais de acordo com a linha bolsonarista. Errei. Erramos todos.
Bolsonaro tem se revelado um político habilidoso ao superar sucessivas crises criadas pela mais implacável e covarde oposição que já existiu contra um presidente aqui em Pindorama. E é nesta oposição e na sua covardia que está a explicação de como Kassio Nunes Marques chegou à condição de indicado.
O modelo de governabilidade inicial de Bolsonaro baseava-se na sua pretensão de formar um governo técnico e, a este perfil governamental, corresponder um apoio de bancadas temáticas no Congresso. Porém, o desenrolar dos acontecimentos ao longo do primeiro ano de mandato, influenciado sobretudo pelas crises criadas pela perseguição da imprensa “desmamada” e dos presidentes das duas casas do Congresso, empurrou o presidente Bolsonaro para os braços do Centrão.
Jair Bolsonaro passou, então, a uma segunda etapa de construção de sua governabilidade. Sua aliança com os partidos de Centro e Centro-Direita tem garantido alguma paz – ou, talvez, menos estragos – vindos de seus adversários mais covardes.
O primeiro semestre de 2020 foi um turbilhão de crises. É difícil entender como o presidente resistiu e ainda manteve sua popularidade. Institucionalmente, porém, sabemos que foi a aliança com os partidos de Centro que garantiu a Bolsonaro a passagem por essa tormenta.
Convém lembrar aos conservadores do Brasil que há poucos anos, em 2014, por exemplo, seria inimaginável ter um presidente conservador e um cenário tão alvissareiro de mudanças como temos hoje. Na ocasião, tivemos que votar em Aécio Neves e nos dar por satisfeitos com aquilo como se fosse o ponto mais longe que conseguiríamos chegar.
A ascensão de Bolsonaro criou a fantasia infantil de que a partir daquele instante sairíamos do inferno para o paraíso. “Eu não elegi Bolsonaro para isso”, dizem as “crianças”.
A política não é para crianças, nem para ansiosos. Nossos adversários entendem isso muito bem. É uma luta constante. Bolsonaro não traiu seus eleitores. Ele está mantendo a viabilidade de seu governo a duras penas e suportando todos os ônus enquanto as crianças fazem pirraça e criticam suas atitudes.
No campo de batalha as ordens devem ser cumpridas. É o general e não a tropa que enxerga o jogo com a visão ampla que o teatro de operações exige. Bolsonaro é o general e nossa tropa precisa acatar suas decisões. Algumas serão erradas, outras serão certas. O que importa é chegarmos ao fim do mandato com mais avanços à Direita do que tínhamos anteriormente. É preciso lembrar que o paraíso só virá depois da morte.